Edição 09 – Julho de 2009
Gavião-de-penacho (Spizaetus ornatus)
O gênero Spizaetus é representado por grandes gaviões que habitam as florestas das Américas do Sul e Central, África e Ásia. O gavião-de-penacho (Spizaetus ornatus) é uma das três espécies que apresentam ampla distribuição na região neotropical, ocorrendo em quase todo o Brasil. No entanto, essa espécie e seus congêneres se tornaram extremamente raras fora dos domínios Amazônicos devido à destruição do seu habitat.
Spizaetus ornatus mede entre 56 e 65 cm. de comprimento, e pesa entre 835 e 1610 g., havendo uma diferença de tamanho entre os sexos, sendo a fêmea maior que o macho. A espécie recebe esse nome devido ao notável penacho que se ergue verticalmente no topo da cabeça. Apresenta plumagem de vistoso colorido, topo da cabeça preto, face e lados do pescoço castanhos, garganta branca, peito e abdômen com barras negras, assim como os seus emplumados tarsos. Sua silhueta em voo se caracteriza por asas largas e arredondadas, cauda longa e cinza com três notáveis barras negras. A íris, a cere (região do bico onde estão localizadas as narinas) e os pés são amarelos.
Alimentação
O gavião-de-penacho apresenta dieta diversificada, com variações locais. Na Guatemala, pesquisadores documentaram esquilos (Sciurus spp.) como o item alimentar predominate, seguido de outras aves. Em Manaus, na Amazônia brasileira, aves compõem a maior parte da dieta do gavião-de-penacho, que também se alimenta de lagartos da família Teiidae e mamíferos como gambás e cuícas (Didelphis marsupialis e Metachirus nudicaudatus). Em outras regiões, o gavião-de-penacho já foi registrado se alimentando de mamíferos como o jupará (Potus flavus), o quati (Nasua narica), o tapeti (Sylvilagus brasiliensis) e os micos Callithrix penicillata, Sanguinius fuscicollis e Saimiri scirueus, além das seguintes aves: cigana (Opisthocomus hoazin), biguatinga (Anhinga anhinga) e pomba-asa-branca (Columba picazuro).
Reprodução
No Brasil, a época reprodutiva se inicia em Agosto com os trabalhos de retoque do ninho, que se caracteriza por uma volumosa estrutura de galhos secos, que ultrapassa 1,0 m. de comprimento e largura, construído em grandes árvores. Nesse período o casal vocaliza intensamente enquanto executa manobras aéreas sobre o sítio de nidificação.
A postura é de um único ovo, totalmente branco. A fêmea fica responsável pela incubação, que chega a 48 dias, enquanto é alimentada pelo macho. O filhote abandona o ninho com mais de 80 dias de idade, mas permanece no sítio reprodutivo dependendo dos pais por aproximadamente um ano. Nessa idade, o jovem apresenta uma plumagem branca, apenas com os flancos e os tarsos com barras negras. O castanho do pescoço e as demais características da plumagem adulta surgem com as mudas consecutivas, após o terceiro ano de vida.
O gavião-de-penacho em Minas Gerais
A extensa distribuição da espécie, que inclui todo o domínio Amazônico, foi possivelmente o critério decisivo para a sua exclusão da lista nacional de espécies ameaçadas, publicada em 2008. No entanto, o gavião-de-penacho enfrenta problemas de conservação em todos os estados do sudeste e sul do país, devido principalmente à redução das áreas florestais. Recentemente, a espécie foi registrada em diversas localidades em Minas Gerais, mas a maioria dos contatos ocorreu com indivíduos isolados. Em apenas três localidades foram observados casais: na Área de Proteção Ambiental de Lagoa Santa e no vale do rio Araguari, onde a nidificação da espécie foi documentada, e no Parque Estadual do Rio Doce, que pode abrigar a mais significativa população da espécie no estado.
O gavião-de-penacho em Viçosa
Registros históricos de indivíduos jovens em determinadas localidades da Zona da Mata, indicam que a espécie ainda poderia se reproduzir em remanescente da região, mas a falta de novos registros na ultima década sugere que os fragmentos da região de Viçosa não oferecem mais condições para a presença da espécie.
Para a conservação regional do gavião-de-penacho, é urgente a proteção integral dos sítios reprodutivos já descritos, o estabelecimento de projetos de pesquisa e monitoramento, e a realização de programas de educação ambiental que visem desfazer as ameaças secundárias como a caça e a perseguição.
Você Sabia?
No Brasil, os Falconiformes se distribuem em duas famílias principais: Accipitridae (gaviões e águias), e Falconidae (carcarás, gralhões e falcões). Além de divergências morfológicas, como a forma e estrutura de alguns ossos, e a sequência da muda das penas de voo, o comportamento dos dois grupos é diferente em alguns aspectos. Enquanto gaviões e águias abatem suas presas com as garras, utilizando o bico apenas para limpar e dilacerar a caça, os falcões possuem os pés mais fracos, que são utilizados para segurar a presa que é abatida com o bico. Os falcões também não constroem seus ninhos (salvo poucas exceções). Eles utilizam cavidades em árvores, barrancos e rochas, ou mesmo os ninhos de outras aves. Já os gaviões e as águias constroem ninhos de gravetos e galhos secos.
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Giancarlo Zorzin – Biólogo