Edição 03 – Janeiro de 2009

Morcego-vampiro-comum (Desmodus rotundus)

Os morcegos são animais cercados por lendas e mitos. Muitas pessoas acreditam que eles são ratos velhos que criaram asas, ou que são criaturas demoníacas. Mas, com certeza, nenhuma dessas crenças é tão conhecida quanto o mito dos morcegos serem vampiros.

Muitas vezes considerados vilões, os morcegos hematófagos (que se alimentam de sangue, o que os levou a serem chamados de “morcegos vampiros”) não são conhecidos de forma correta pela maioria das pessoas. Das mais de 1100 espécies de morcegos, apenas três são hematófagas: Desmodus rotundusDhiphylla ecaudata e Diaemus youngii, sendo que estas duas últimas atacam preferencialmente aves e são mais raras.

Espécies de morcegos que se alimentam de sangueA) Desmodus rotundus. B) Dhiphylla ecaudata. C) Diaemus youngii

Os morcegos hematófagos são encontrados nas regiões tropicais das Américas, isto é, do Norte do México ao Norte da Argentina, ocorrendo, portanto, em território brasileiro. São mamíferos da ordem Chiroptera, família Phyllostomidae, subfamília Desmodontinae. Esta subfamília apresenta como características peculiares a presença de um apêndice nasal (uma estrutura no focinho) em forma de ferradura. Além disso, possuem polegares bem desenvolvidos, e, é claro, o hábito hematófago. O “morcego-vampiro-comum”, Desmodus rotundus é robusto, apresentando uma envergadura (distância entre as pontas das asas abertas) em torno de 35 cm. e pesando entre 25 e 40 g., sendo considerado de médio porte quando comparado às outras espécies. A pelagem é bastante macia, em geral de coloração cinza brilhante, mas pode apresentar também tons avermelhados, dourados ou mesmo alaranjados. Podem viver até 20 anos.

Morcego-vampiro-comum: Desmodus rotundus.

Hábitos

O morcego-vampiro-comum habita ambientes de floresta úmida, cerrado, campos e regiões áridas. É uma espécie gregária, formando colônias com mais de 2000 indivíduos, sendo mais freqüente 20 a 100 indivíduos. Raramente vivem isolados. São comumente encontrados abrigados em cavernas, minas, túneis, bueiros, ocos de árvores, e até mesmo edificações humanas. A população em cada abrigo depende das condições climáticas internas e da disponibilidade de alimento na área.

Assim como a maioria dos morcegos, o Desmodus rotundus possui hábitos noturnos. Ao contrário do que muita gente acredita, os morcegos não são cegos, mas orientam-se preferencialmente por um sistema de sonar, conhecido como ecolocação, no qual emitem sons através de sua boca ou narinas. O som atinge o obstáculo ou o potencial alimento e ecoa de volta ao morcego, trazendo informações perfeitas sobre o tamanho, o formato e a direção de deslocamento do objeto. Com a ecolocação um morcego pode capturar presas tão pequenas e finas quanto um fio de cabelo. Baseado neste mecanismo é que foi criado, por exemplo, o aparelho de ultrassom, hoje utilizado na medicina.

O morcego-vampiro-comum possui grande agilidade e mobilidade, conseguindo “caminhar” no solo apoiado em seus polegares. Costuma morder suas presas nas orelhas, dedos e outras extremidades, pois são locais de difícil percepção e de acesso mais fácil.

Os morcegos-vampiros podem habitar cavernas, ocos-de-árvores, bueiros e até mesmo habitações humanas.

Alimentação

A maioria das pessoas possui idéias errôneas sobre a alimentação dos morcegos-vampiros. Primeiramente eles abrem uma ferida em sua presa usando os dentes incisivos (e não os caninos!), extremamente afiados e chamados de escalpelo. Em seguida, eles não chupam, mas lambem sangue que escorre da ferida aberta. Sua saliva contém substâncias anticoagulantes (que impedem que o sangue coagule, escorrendo facilmente) e acredita-se que também existam substâncias com propriedades anestésicas que facilitam o ataque à presa.

Desmodus rotundus, possui hábito alimentar estritamente hematófago, sendo que pode se alimentar tanto de sangue de aves como de mamíferos, podendo consumir até 30 mililitros de sangue em uma única noite. Ataca preferencialmente mamíferos de grande porte, sendo que a introdução de animais domésticos como cavalos, bovinos, e suínos têm levado ao aumento do número de Desmodus rotundus nos últimos 300 anos. Atrelado a este aumento populacional surgem sérios problemas sanitários e econômicos, como por exemplo, a raiva.

A raiva é uma doença fatal que vem sendo disseminada entre os rebanhos devido à falta de vacinação do gado e aos ataques de morcegos. No entanto é importante ressaltar que os morcegos-vampiros não são os únicos capazes de transmitir a raiva. Outras espécies de morcegos que estiverem contaminadas com o vírus podem ser vetores da doença e transmiti-la a outros animais, inclusive ao homem, através da mordida, mas estes casos são pouco relatados.

O ataque de morcegos-vampiros a humanos é raro, podendo ocorrer em regiões de escassez de outras formas de alimento.

Reprodução

Desmodus rotundus é considerada uma espécie poliéstrica, ou seja, sem um período definido de reprodução, podendo se reproduzir durante todo o ano. Contudo, o nascimento da maioria dos filhotes se concentra na estação mais quente e chuvosa. A gestação dura em torno de sete meses, com o nascimento de um filhote por vez, sendo que casos de gêmeos são raros. No segundo mês de vida o filhote já recebe alimento regurgitado pela mãe. O cuidado parental dura até o quarto mês, e o filhote se torna independente no quinto mês de vida.

Importância

Os morcegos-vampiros têm grande importância no ecossistema. Sabe-se que eles comumente habitam cavernas, locais pobres em fontes de nutrientes. Há, portanto, a necessidade de mecanismos que forneçam energia a este ambiente. Neste ponto os morcegos têm um papel fundamental: as fezes deixadas por eles são uma rica fonte de nutrientes para pequenos invertebrados cavernícolas que, conseqüentemente, servem de alimento para animais maiores. Sendo assim, as fezes dos morcegos são essenciais para a manutenção da cadeia alimentar num local primariamente considerado inóspito.

Portanto, a manutenção da biodiversidade de ambientes como grutas e cavernas está diretamente associada à preservação das colônias não só de morcegos-vampiros, mas de morcegos de um modo geral.

O morcego-vampiro em Minas Gerais

Desmodus rotundus é frequentemente encontrado em áreas com presença de animais de criação. Não se encontra ameaçado de extinção no Brasil, e no estado de Minas Gerais é uma espécie amplamente distribuída. A Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) possui inclusive vários programas visando o controle das populações do morcego-vampiro-comum, a fim de manter o risco da raiva sob controle.

O morcego-vampiro em Viçosa

Em Viçosa, há registros da presença do morcego-vampiro-comum em anos passados. A espécie ainda não foi encontrada durante os trabalhos que atualmente estão sendo desenvolvidos, mas devido à presença de gado na região, acredita-se que o Desmodus rotundus ainda ocorra no município.

Você Sabia?

Os morcegos ficam de cabeça para baixo para facilitar o seu voo. Esta posição peculiar tem a ver com o fato deles serem os únicos mamíferos capazes de voar. A posição de “cabeça para baixo” facilita a saída para o voo: os morcegos se desprendem do local onde estão, seja um galho, uma rocha ou um forro de telhado, abrem as asas, planam, e em seguida, batem as asas. Às vezes podemos nos deparar com morcegos caídos no chão que não conseguem voar. Nesta situação, eles precisam escalar um lugar mais alto que lhes permita em seguida saltar e planar para iniciar o voo. No entanto, o morcego-vampiro-comum, consegue “correr” no solo, e levantar voo a partir de uma superfície horizontal.

Morcegos-vampiros conseguem se impulsionar a partir do chão.

Referências Bibliográficas

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Maria Clara do Nascimento – Bióloga

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