Edição 21 – Julho de 2010
Camaleãozinho (Enyalius perditus)
O gênero Enyalius contém atualmente nove espécies de lagartos, as quais se distribuem principalmente por áreas florestadas da Mata Atlântica, podendo ser encontradas também em algumas regiões da Amazônia e Cerrado. Algumas espécies ainda podem habitar bordas de mata e ambientes alterados, como plantações de café e áreas de pastagem. O camaleãozinho (Enyalius perditus), também conhecido como lagarto-verde, papa-vento ou camaleão, é encontrado nos estados de Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo, habitando geralmente florestas localizadas em áreas de altitude elevadas (acima de 1.000 m) dentro do bioma da Mata Atlântica.
O camaleãozinho possui pequeno porte, e embora possa atingir quase 30 cm de comprimento, cerca de dois terços de seu corpo são compreendidos pela sua longa cauda. O nome do gênero, Enyalius, vem do grego, e significa belicoso, ou seja, “habituado à guerra”, “agitado”, “furioso”, talvez em referência ao comportamento destes lagartos quando capturados, que se debatem para fugir e tentam morder seu agressor. O nome específico perditus vem do latim e significa perdido, uma alusão ao fato de a espécie ter sido por muito tempo confundida com Enyalius catenatus.
Hábitos e alimentação
Enyalius perditus possui atividade diurna e hábito semiarborícola, ocupando tanto a vegetação arbórea e arbustiva quanto a serapilheira das áreas onde ocorre. Durante a noite, pode ser encontrado em repouso na extremidade de galhos. Geralmente, lagartos de diversas espécies que são ativos durante o dia costumam dormir na ponta de galhos ou sobre folhas largas. Isto lhes confere camuflagem, dificulta que sejam capturados por um predador que escale os galhos mais fortes, e também facilita a fuga no caso de serem vistos.
A dieta de Enyalius perditus é composta principalmente de pequenos invertebrados. Alimenta-se de besouros, formigas, grilos, aranhas e larvas de mariposas e borboletas. É uma espécie que não possui autotomia caudal, um comportamento comum em muitos lagartos que soltam um pedaço da cauda quando ameaçados por um predador.
Reprodução
O camaleãozinho apresenta dicromatismo sexual, o que significa que a cor do macho é diferente da fêmea. Em geral, os machos adultos possuem uma coloração esverdeada, que tende a escurecer à medida que se aproxima da cauda. Já as fêmeas possuem um padrão variegado, mesclando tons que vão do marrom claro ao preto. Os jovens apresentam coloração semelhante a das fêmeas, sendo que os machos possuem variação ontogenética da coloração, tornando-se verdes à medida que crescem. Este tipo de mudança na cor da pele é uma característica comum a quase todas as espécies do gênero Enyalius.
As fêmeas de Enyalius perditus são ligeiramente maiores que os machos. É uma espécie ovípara, que possui o período reprodutivo associado principalmente à estação chuvosa, de novembro a janeiro. Durante esta época, a fêmea costuma apresentar uma coloração alaranjada na região peitoral e gular, próxima à boca. Em um estudo com exemplares em cativeiro, observou-se que a cópula de Enyalius perditus pode durar de 15 a 45 minutos. Neste tempo, o macho se aproxima rapidamente da fêmea, mordendo-a na região do pescoço para segurá-la. Em seguida, insere um de seus dois hemipênis na cloaca da fêmea, começando o processo de coloração nupcial. Deste momento em diante, o macho começa a mudar de cor, alterando sua aparência esverdeada para tons de marrom escuro, vindo a retornar ao verde tradicional somente ao final da cópula. As ninhadas podem ter de 7 a 14 ovos, e o nascimento dos filhotes ocorre no final da estação chuvosa. Dentro de aproximadamente um ano, os jovens já terão atingido a fase adulta, estando aptos para reprodução.
O camaleãozinho em Minas Gerais e em Viçosa
A ocorrência do camaleãozinho em Minas Gerais é associada principalmente para áreas de mata bem preservada, sobretudo em regiões serranas. Exemplos de localidades onde a espécie pode ser encontrada são: Parque Estadual da Serra do Ibitipoca (Lima Duarte), Parque Estadual Nova Baden (Lambari), Floresta Estadual do Uamii (Ouro Preto) e Serra do Ouro Branco (Ouro Branco).
Duas espécies de Enyalius são conhecidas em Viçosa (E. bilineatus e E. brasiliensis), mas não há registros da presença de Enyalius perditus. Provavelmente, a ausência de áreas grandes de vegetação contínua e as altitudes menores da região (abaixo de 1.000 m) não propiciem as condições necessárias para a sobrevivência da espécie no município. Entretanto, ela pode ser encontrada no Parque Estadual da Serra do Brigadeiro, aproximadamente a 30 km leste de Viçosa.
Você Sabia?
Os camaleões-verdadeiros são lagartos da família Chamaeleonidae, que não ocorrem nas Américas. Habitam apenas o Velho Mundo, principalmente ao sul do continente africano e na ilha de Madagascar. São animais facilmente reconhecíveis pelas mãos e pés zigodáctilos, com dedos voltados para frente e para trás como um fórceps, semelhante aos pés de periquitos, araras e papagaios. Os camaleões-verdadeiros ainda destacam-se pela capacidade de movimentar os olhos de forma independente um do outro, pela língua muito longa, usada para capturar alimento, e também pela cauda preênsil, utilizada para se segurar na vegetação. Obviamente, o que todo mundo lembra quando se fala em camaleão é a sua notória capacidade de mudar a cor a da pele, usada para expressar mudanças nas condições fisiológicas e realizar interações sociais.
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Mário Ribeiro de Moura – Biólogo